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O Senado aprovou nesta quarta-feira (21), por 58 votos a 18, a indicação de Cristiano Zanin, 47, como novo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).
Primeiro indicado por Lula (PT) no atual mandato para a corte, Zanin é amigo do presidente, para quem advogou nas ações da Operação Lava Jato, e precisava do voto de ao menos 41 senadores (de um total de 81 integrantes da Casa) para ser chancelado.
Ele ocupará a vaga de Ricardo Lewandowski, que se aposentou em abril, e poderá ficar no STF até novembro de 2050, quando completa 75 anos, idade-limite para ministros da corte.
Antes da aprovação pelo plenário do Senado, Zanin passou por sabatina na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Casa, onde também teve seu nome aprovado, por 21 votos a 5.
A confirmação do novo integrante do STF ocorreu 20 dias após a indicação de seu nome pelo presidente da República.
A escolha foi alvo de questionamentos de que poderia representar uma violação ao princípio da impessoalidade.
Zanin, porém, conseguiu conquistar a simpatia dos atuais ministros do STF e de grande parcela de políticos, inclusive ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), após ter se notabilizado por questionamentos à Lava Jato.
“Parabéns ao ministro Cristiano Zanin pela merecida aprovação no Senado Federal. Tenho absoluta certeza de que o Brasil ganhara com sua atuação competente e corajosa em nossa Suprema Corte”, escreveu Alexandre de Moraes, ministro do STF, após a confirmação do novo integrante do tribunal.
Lula sofreu pressão dentro e fora do governo para indicar uma magistrada negra, mas não cedeu. Dos atuais dez ministros do STF, há apenas duas mulheres (Rosa Weber e Cármen Lúcia) e nenhum negro.
Desde 1891, a corte teve só três ministros negros em sua composição (o último foi Joaquim Barbosa, que se aposentou em 2014) e só três ministras mulheres (além das duas em exercício, a primeira foi Ellen Gracie).
Ao longo da semana passada, Zanin fez um périplo pelos gabinetes do Senado para se aproximar dos parlamentares e angariar apoio mesmo entre evangélicos e opositores do atual governo.
A sabatina transcorreu sem sobressaltos e com elogios ao advogado, inclusive da oposição a Lula. Senadores se manifestaram de forma positiva, sobretudo, ao perfil garantista de Zanin -ou seja, que reforça o direito de ampla defesa de acusados e investigados.
Com parte dos senadores investigados e outra parte em busca de blindagem para evitar problemas judiciais, a avaliação nos últimos meses foi de que a postura jurídica de observar com atenção o respeito às garantias dos investigados teria grande peso no voto dos parlamentares.
Como a Folha de S.Paulo mostrou, quase metade da atual composição do Senado já foi alvo de inquérito ou de processo criminal conduzido pelo Supremo.
Em seu discurso inicial, antes de iniciar a etapa das perguntas na sabatina desta quarta, Zanin se defendeu de ser chamado de termos como “advogado pessoal” e “advogado de luxo” de Lula.
“Sou advogado. Alguns me rotulam como advogado pessoal, porque lutei contra interesses pessoais, sempre respeitando as leis brasileiras e a Constituição”, afirmou.
“Também me classificam como advogado de luxo, porque defendi, estritamente com base nas leis brasileiras causas empresariais de agentes institucionais importantes para a economia e que empregam milhares de pessoas. Ainda me chamam de advogado de ofício, como se fosse um demérito.”
Questionado pelo senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) se o fato de ter sido advogado de Lula pode constrangê-lo em julgamento ou comprometer sua imparcialidade, Zanin afirmou que, uma vez nomeado, vai se guiar pela Constituição e não estará subordinado “a quem quer que seja”.
“Em minha visão, e acredito que também é a visão do presidente da República que me indicou, um ministro do Supremo Tribunal Federal só pode estar subordinado à Constituição da República”, afirmou.
O advogado disse ao senador Sergio Moro (União Brasil-PR) que irá analisar caso a caso os processos da Lava Jato antes de se declarar impedido ou suspeito.
A esperada interação dos dois na sabatina girou em torno da possibilidade de o advogado julgar processos da operação e ocorreu sem sobressaltos.
Zanin e Moro têm rusgas desde que o advogado defendeu Lula na Lava Jato, da qual Moro era juiz.
“Num passado recente, quase tudo o que funcionava em varas especializadas criminais muitas vezes recebia a etiqueta de Lava Jato. Isso não é para mim um critério para um controle jurídico, mas sim aquele que a lei prevê, que é analisar as partes e o conteúdo”, afirmou.
“Uma vez identificada uma hipótese de impedimento e suspeição, não terei o menor problema em declarar o impedimento ou a suspeição e não participar do julgamento.”
Durante a sua carreira como advogado de Lula, Zanin ficou conhecido por questionar a imparcialidade dos juízes que julgavam as ações contra o presidente, muitas vezes apontando o que considerava serem relações suspeitas.
Lula teve condenações anuladas porque o Supremo considerou parcial o ex-juiz Sergio Moro, a partir de um recurso apresentado por Zanin.
Na articulação para ser aprovado, o advogado contou com a ajuda de ministros do STF que têm boa relação com o mundo político, como Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, e até dos indicados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para a corte, como Kassio Nunes Marques e André Mendonça.
Na sabatina, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) usou sua fala para fazer críticas ao julgamento do seu pai Jair Bolsonaro no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e ao inquérito aberto pelo ministro Alexandre de Moraes.
Uma das perguntas feitas nesta quarta-feira (21) por Flávio foi sobre o que Zanin pensa da “famigerada prática de ‘fishing expedition'”. “É uma pescaria, como chamado no mundo jurídico, na qual se joga uma rede, puxa e se vê o que é que vem agarrado nela, mesmo sem fundamento nenhum”, explicou o termo.
“Sabe como é que é, quando se diz que vai buscar o cartão de vacinação na casa de alguém para pegar o telefone celular?”, continuou. A referência de Flávio é à investigação sobre fraudes no cartão de vacinação de Bolsonaro, que apreendeu o celular do tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordem do ex-presidente.
Em resposta, Zanin disse que a prática do fishing expedition deve ser condenada. “O estado não pode eleger alguém como alvo e depois buscar provas contra esse alvo”, afirmou, acrescentando que essa prática tem levado à anulação de processos.
Flávio também comparou o processo que pode levar à inelegibilidade do seu pai no TSE, sobre o encontro com embaixadores no qual repetiu mentiras sobre urnas eletrônicas, ao que absolveu a chapa Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) em 2017.
“Eu quero crer que o TSE, em especial o ministro Alexandre de Moraes julgará uma ação movida pelo PDT com a mesma lisura que julgou a ação do PSDB em 2017, que manteve Temer no poder e, graças a isso, Alexandre de Moraes hoje é ministro do Supremo Tribunal Federal”, acrescentou.
E perguntou: “O senhor entende que processos instruídos sem o devido processo legal, contraditório ou com provas fora do prazo legal são passíveis de nulidade?”.
Zanin disse que não conhece o caso concreto e que não comentaria. Mas acrescentou que “de modo geral, os processos têm um rito e cada fase que é encerrada não pode ser reaberta”.
Zanin ficou conhecido em sua carreira sobretudo por ter feito uma defesa aguerrida de Lula. Acabou se tornando alvo inclusive do próprio PT por sua estratégia durante a prisão de 580 dias do presidente.
Desde o início deste ano, Lula já dava sinais de que indicaria Zanin à corte. Ao anunciar a sua escolha, o presidente disse achar que “todo mundo esperava” que o advogado seria o escolhido.
“[Indiquei] não só pelo papel que teve na minha defesa, mas simplesmente porque eu acho que Zanin se transformará num grande ministro da Suprema Corte desse país”, disse o presidente.
“Conheço as qualidades como advogado, conheço as qualidades dele como chefe de família e conheço a formação dele. Ele será um excepcional ministro do STF se aprovado pelo Senado, e acredito que será, e acho que o Brasil vai se orgulhar de ter o Zanin como ministro da Suprema Corte”, afirmou.
RAIO X – CRISTIANO ZANIN MARTINS
Natural de Piracicaba (SP), é graduado em direito pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). Autor do livro “Lawfare, Uma Introdução”, em parceria com Valeska Teixeira Zanin Martins e Rafael Valim, comandou a defesa de Lula ao longo da Operação Lava Jato, deflagrada em 2014.