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Fortaleza dá um novo passo rumo ao avanço tecnológico após a ativação do sinal 5G na última segunda-feira (5). Mas apesar de a internet mais rápida ter sido anunciada para 48 bairros da cidade – fugindo do clichê de se restringir às áreas mais nobres -, a necessidade de ter um smartphone compatível com a tecnologia para ter acesso à novidade escancara o abismo digital fruto de uma série de questões socioeconômicas.
Na mesma cidade em que fica de fora do 5G – pelo menos por enquanto – quem não tem um smartphone compatível, há quem sequer tenha um smartphone ou mesmo acesso a qualquer internet. A estudante de Serviço Social Maria de Fátima de Sá Gonçalves, a mãe e o irmão, por exemplo, compartilham o mesmo celular.
Em janeiro deste ano, o aparelho de Maria quebrou e ela ainda não teve condições de comprar outro; por isso, usa o que é da mãe. Além disso, o bairro em que mora, Granja Lisboa, ficou de fora da lista das operadoras para recebimento do 5G.
“Meu celular ‘pifou’ e, como eu estava sem dinheiro e ainda estou, não posso comprar outro. Aí eu e meu irmão usamos o celular para estudar”, diz Maria de Fátima. Questionada sobre o que ouviu falar a respeito do 5G, ela pontua que soube da novidade, mas reforça que não tem condições de ter acesso. “Eu tenho Wi-Fi em casa, pago o mais barato, mas a internet vive caindo”, diz, acrescentando que espera um dia ter acesso à tecnologia 5G.
Relatos como o de Maria de Fátima levam ao questionamento: mas, afinal, o 5G chegou para quem? Um levantamento do Diário do Nordeste mostra que os preços dos celulares compatíveis começam em R$ 1.399,08 – caso do Galaxy A13. Entre o smartphone compatível mais barato e o salário mínimo atual, de R$ 1.212, existe uma distância de R$ 187,08. Sem considerar que esse piso está longe do necessário para viver.
Diante da incompatibilidade de muitos aparelhos com a tecnologia, a Claro tem provocado os fabricantes para trazer modelos mais acessíveis ao sinal, de acordo com o diretor da operadora no Nordeste, André Peixoto. “Desde antes do lançamento oficial, nós brigamos para ter em nosso portfólio aparelhos mais acessíveis, temos smartphones combinados com planos a partir de R$ 799”.
Ele também destaca que a Claro “traz para a navegação ilimitada os principais aplicativos como Instagram, TikTok, WhatsApp e Twitter, sem abater da franquia. A gente dá mais franquia, mais experiência de apps para gerar conteúdo, mas isso tem que ser bem casado com o acesso aos aparelhos, esse acesso não pode ser dificultado”, detalha Peixoto.
Sobre o tema, o diretor de vendas da Tim no Nordeste, Bruno Talento, pontua que estar em bairros que fujam do eixo considerado mais nobre é o primeiro passo para a democratização do serviço e acredita que com o passar do tempo a tecnologia será mais acessível a todas as camadas. “Nosso portfólio contempla celulares de R$ 1,4 mil, mas sabemos que essa tecnologia tende a ser mais acessível com o passar do tempo”.
Ele também acredita que, para que o 5G seja acessível, é preciso o desenvolvimento de aplicações que se utilizem da tecnologia, o que requer que setor privado e poder público caminhem juntos.
Em São Paulo, por exemplo, uma das maneiras de viabilizar o 5G para camadas menos abastadas foi por meio de parceria entre a Tim, Motorola, American Tower e a ONG Gerando Falcões, que juntas objetiva fornecer o sinal, equipamentos e infraestrutura para promover melhor acesso à educação, serviços financeiros e mercado de trabalho.
Na economia, o 5G vem para habilitar o próximo nível dos negócios no Ceará, avalia o diretor de Marketing da Embratel, Alexandre Gomes. “Vários segmentos da economia, desde instituições públicas a privadas, turismo, saúde, finanças, indústria 4.0… essas áreas passam a ter a possibilidade da digitalização mais completa possível”.
Pilares básicos para uma vida digna; saúde e educação já vêm sendo ventilados como áreas que serão extremamente beneficiadas pelo sinal desde muito antes da chegada do 5G ao Brasil. Esse impacto tem o poder de transformar o cotidiano de quem depende do ensino público e dos serviços prestados pelos postos de saúde e hospitais públicos.
O professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Moacyr Regys, também acredita que se não houver iniciativas das operadoras e uma parceria com o poder público, dificilmente essa fatia da população terá acesso ao 5G. Ele lembra que esse público pode ser usuário do sinal de forma indireta, na saúde e educação.
“Consultas poderão ser realizadas de forma online. Na educação, o 5G permite o uso da realidade virtual nas salas de aula”, explica. Moacyr Regis lembra, inclusive, que uma das prerrogativas da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) no leilão do 5G era que as operadoras levassem internet móvel de qualidade às escolas públicas de educação básica.
Professor do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Teleinformática da Universidade Federal do Ceará (UFC), Victor Farias avalia que o grande potencial do 5G está justamente na sua característica de “ser uma tecnologia habilitadora de novas aplicações”.
Na saúde, para que sejam possibilitadas as teleconsultas, porém, ele detalha que será necessário equipar postos de saúde de cidades “com equipamento que se conecte ao 5G dotado de microfone e câmera de alta definição. Técnicos de enfermagem do posto de saúde poderiam auxiliar na condução da consulta.
Na segurança, o 5G pode permitir a transmissão em tempo real e em alta resolução de ocorrências, com programas que se utilizem de soluções baseadas em inteligência artificial para detecção automática de, por exemplo, acidentes de trânsito ou arrombamentos. “Ao detectarem uma ocorrência, esses programas podem de forma automática enviar equipes de segurança para o local”.
No transporte, Alexandre Gomes visualiza também a melhoria da mobilidade urbana, com melhor distribuição dos ônibus, por exemplo. “Imagine painéis pela cidade, oferecendo uma previsibilidade maior de horários ou poder contratar um veículo para ir de uma praia a outra com muito mais agilidade”, avalia.
“O 5G vai viabilizar soluções de forma mais ampla. Quando o 4G chegou, não tínhamos Uber, Waze… através da infraestrutura colocada eles foram surgindo e é o que deve acontecer com a chegada do 5G”, detalha.
Fonte: Diário do Nordeste